Crianças de baixa renda são as mais afetadas pelo problema | Crédito: Pixabay
Nathalia Silva e Thaís Mundim
A educação é uma das bases fundamentais para o desenvolvimento de uma sociedade. No entanto, quando se trata da educação infantil, uma realidade preocupante tem se apresentado em Goiânia: o déficit de vagas nas creches e pré-escolas. Quase dois meses após o início do segundo semestre do ano letivo de 2023, 9 mil crianças ainda estão sem vaga nos Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs). Essa é a situação atual da educação infantil em Goiânia, embora a atual gestão afirme ter ofertado quase cinco mil novas vagas desde 2021.
Várias razões podem ser apontadas para o déficit de vagas na educação infantil. Primeiramente, o crescimento populacional e o aumento das taxas de natalidade contribuem para um aumento constante na demanda por vagas em creches e pré-escolas. No entanto, o investimento insuficiente na expansão dessas instituições tem deixado muitas famílias sem opções adequadas.
A Secretaria Municipal de Educação de Goiânia (SME) informou que a previsão é que sejam entregues, até o final de 2024, mais 32 CMEIs. A SME também anunciou quais medidas estão sendo tomadas para resolver o problema da falta de vagas na educação infantil em Goiânia.
Entre as medidas, a abertura de novas CMEIS e ampliação dos existentes para acomodar a demanda crescente. A expectativa é que nos próximos 60 dias sejam iniciadas oito obras nos seguintes bairros: Residencial Flamingo, Bairro São Domingos, Alto do Vale II, Setor Tempo Novo, Carolina Parque, Orlando de Moraes, Alto do Vale, Conjunto Primavera e Jardim Guanabara II.
Sobre as obras inacabadas, a Secretaria afirmou que “das 12 obras paralisadas no passado, a Prefeitura já retomou a obra do CMEI Santa Helena e em breve também inicia a execução do CMEI Barravento e das outras dez obras que estão em fase final de licitação”. Além disso, a Prefeitura afirma que amplia as vagas na educação infantil com a criação de turmas e assinatura de convênios, conforme a necessidade da comunidade.
Desenvolvimento acadêmico e emocional das crianças é impactado
O acesso à educação infantil é um direito estabelecido pela Constituição brasileira, e sua importância é inegável. Essa etapa do ensino não apenas auxilia no desenvolvimento cognitivo das crianças, mas também promove a socialização, estimula habilidades motoras e emocionais, e, acima de tudo, oferece às crianças um ambiente seguro e adequado para seu crescimento.
“A falta de vagas em escolas de educação infantil pode resultar em atrasos no desenvolvimento de habilidades fundamentais, como linguagem, alfabetização e habilidades matemáticas. Impacta no desenvolvimento sócio emocional, já que na convivência escolar as crianças aprendem a interagir com os pares, a resolver conflitos e a construir um autoconceito positivo”, afirma a psicopedagoga Cristiane Caldas.
A profissional destaca que as crianças de baixa renda são as mais afetadas, trazendo desafios também para os pais. “Quando as escolas de educação infantil não têm vagas suficientes, os pais que trabalham fora de casa podem ser forçados a recorrer a cuidadores informais, nem sempre capacitados para a estimulação que as crianças pequenas necessitam”, esclare.
Outra solução encontrada pelos pais, segundo a psicopedagoga, é deixar seus empregos para cuidar das crianças, o que pode ter impactos econômicos significativos. “Tudo isso pode criar um ambiente emocionalmente carregado em casa, prejudicando o desenvolvimento saudável”, ressalta a especialista.
Cristiane relata que a falta de vagas em escolas resulta em impactos de longo prazo no desenvolvimento cognitivo e socioemocional das crianças. ‘‘As janelas de oportunidades no contexto do desenvolvimento infantil referem-se a períodos sensíveis ou críticos durante os quais as crianças são especialmente receptivas a certos tipos de experiências ou aprendizado. São momentos em que o cérebro da criança está particularmente suscetível a certos tipos de estímulo ou aprendizado”, detalha.
A psicopedagoga explica ainda que essas janelas de oportunidade ocorrem em momentos específicos do desenvolvimento infantil e podem ter um impacto duradouro nas habilidades e competências da criança. “Se uma criança não recebe estímulo apropriado ou oportunidades de aprendizado durante esses períodos críticos, pode haver atrasos no desenvolvimento. Por outro lado, quando as crianças são expostas a experiências enriquecedoras durante essas janelas, têm maior probabilidade de desenvolver habilidades e competências de forma mais eficaz”, afirma.
Consequências que afetam famílias e a sociedade
Muitas famílias têm enfrentado uma batalha árdua para encontrar vagas em creches e pré-escolas para seus filhos. Esse é o caso da diarista Marlene Mara, mãe que busca por vagas, mas tem sofrido com o déficit de vagas nos CMEIs de Goiânia.
‘‘Tenho um bebê de um ano de idade e tem sido muito difícil ter que ir trabalhar e não saber com quem deixar meu filho. Optei por CMEI por terem pessoas mais capacitadas para cuidar de um bebê ao invés de pagar qualquer pessoa. Sem contar que pagar uma babá fica fora do orçamento de qualquer família de baixa renda. Eu fiz inscrições em duas creches já, mas a resposta é a mesma: não temos vagas no momento”, afirma a mãe.
Marlene acredita que para resolver esse problema de falta de vagas em na educação infantil “poderia ter uma pesquisa melhor entre as famílias, se realmente as mães estão trabalhando, ou que não tenha uma pessoa em casa que possa ficar com seu bebê, pois sei de mães que não trabalham e têm seus filhos em CMEI em tempo integral. Pesquisas mais a fundo no ato da matrícula ajudariam quem realmente precisa”.
Segundo a psicopedagoga Cristiane Caldas, o déficit de vagas na educação infantil pode resultar em um ciclo de desigualdade. Crianças que não têm a oportunidade de frequentar uma creche ou pré-escola tendem a começar sua jornada educacional em desvantagem em relação a seus colegas que tiveram acesso a esses serviços. O déficit é um desafio que afeta não apenas as famílias, mas também o futuro do país.